Realismo e Naturalismo
Simulado com 20 questões de Linguagens Com Gabarito para a Fatec, Fuvest, Unesp, Unicamp, Unifesp e Univesp com questões de Vestibulares.
01. (UNICAMP) No conto “O espelho”, de Machado de Assis, o esboço de uma nova teoria sobre a dupla natureza da alma humana é apresentado por Jacobina. A personagem narra a situação em que se viu sozinha na casa da tia Marcolina.
“As horas batiam de século a século no velho relógio da sala, cuja pêndula, tic-tac, tic-tac, feria-me a alma interior como um piparote contínuo da eternidade.”
Considerando os indicadores da passagem do tempo na citação, é correto afirmar que
- o movimento oscilante do pêndulo do relógio expressa a duplicidade da alma interior.
- o som do velho relógio da sala materializa acusticamente a longevidade da alma interior.
- a sonoridade repetitiva do pêndulo intensifica as aflições da alma interior.
- o contínuo batimento das horas sugere o vigor da alma interior.
02. (UNICAMP) esse amanhecer mais noite que a noite.
(Carlos Drummond de Andrade. Sentimento do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p.12.)
Silencioso cubo de treva:
um salto, e seria a morte.
Mas é apenas, sob o vento,
a integração na noite.
Nenhum pensamento de infância,
nem saudade nem vão propósito.
Somente a contemplação
de um mundo enorme e parado.
A soma da vida é nula.
Mas a vida tem tal poder:
na escuridão absoluta,
como líquido, circula.
Suicídio, riqueza, ciência...
A alma severa se interroga
e logo se cala. E não sabe
se é noite, mar ou distância.
Triste farol da Ilha Rasa.
(Idem, p. 71.)
A visão de mundo do eu lírico em Drummond é marcada pela ironia e pela dúvida constante, cujo saldo final é negativo e melancólico (“Triste farol da Ilha Rasa”). Tal perspectiva assemelha-se à do
- personagem Leonardo, do romance Memórias de um sargento de milícias.
- personagem Carlos, da obra Viagens na minha terra.
- narrador do romance O cortiço.
- narrador do romance Memórias póstumas de Brás Cubas.
03. (UNICAMP) Durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de gente. E ao lado o Miranda assustava-se, inquieto com aquela exuberância brutal de vida, aterrado defronte daquela floresta implacável que lhe crescia junto da casa (...).
À noite e aos domingos ainda mais recrudescia o seu azedume, quando ele, recolhendo-se fatigado do serviço, deixava-se ficar estendido numa preguiçosa, junto à mesa da sala de jantar e ouvia, a contragosto, o grosseiro rumor que vinha da estalagem numa exalação forte de animais cansados. Não podia chegar à janela sem receber no rosto aquele bafo, quente e sensual, que o embebedava com o seu fartum de bestas no coito.
(Aluísio de Azevedo, O cortiço. 14. ed. São Paulo: Ática, 1983, p. 22.)
Levando em conta o excerto, bem como o texto integral do romance, é correto afirmar que
- o grosseiro rumor, a sexualidade desregrada e a exalação forte que provinham do cortiço decorriam, segundo Miranda, do abandono daquela população pelo governo.
- os termos “grosseiro rumor”, “animais”, “bestas no coito”, que fazem referência aos moradores do cortiço, funcionam como metáforas da vida pulsante dos seus habitantes.
- o nivelamento sociológico na obra O Cortiço se dá não somente entre os moradores da habitação coletiva e o seu senhorio, mas também entre eles e o vizinho Miranda.
- a presença portuguesa, exemplificada nas personagens João Romão e Miranda, não é relevante para o desenvolvimento da narrativa nem para a compreensão do sentido da obra.
04. (UNIFESP) Então começou a minha vida de milionário. Deixei bem depressa a casa de Madame Marques – que, desde que me sabia rico, me tratava todos os dias a arroz-doce, e ela mesma me servia, com o seu vestido de seda dos domingos. Comprei, habitei o palacete amarelo, ao Loreto: as magnificências da minha instalação são bem conhecidas pelas gravuras indiscretas da Ilustração Francesa. Tornou-se famoso na Europa o meu leito, de um gosto exuberante e bárbaro, com a barra recoberta de lâminas de ouro lavrado e cortinados de um raro brocado negro onde ondeiam, bordados a pérolas, versos eróticos de Catulo; uma lâmpada, suspensa no interior, derrama ali a claridade láctea e amorosa de um luar de Verão. [...]
Entretanto Lisboa rojava-se aos meus pés. O pátio do palacete estava constantemente invadido por uma turba: olhando-a enfastiado das janelas da galeria, eu via lá branquejar os peitilhos da Aristocracia, negrejar a sotaina do Clero, e luzir o suor da Plebe: todos vinham suplicar, de lábio abjeto, a honra do meu sorriso e uma participação no meu ouro. Às vezes consentia em receber algum velho de título histórico: – ele adiantava-se pela sala, quase roçando o tapete com os cabelos brancos, tartamudeando adulações; e imediatamente, espalmando sobre o peito a mão de fortes veias onde corria um sangue de três séculos, oferecia-me uma filha bem-amada para esposa ou para concubina.
Todos os cidadãos me traziam presentes como a um ídolo sobre o altar – uns odes votivas, outros o meu monograma bordado a cabelo, alguns chinelas ou boquilhas, cada um a sua consciência. Se o meu olhar amortecido fixava, por acaso, na rua, uma mulher – era logo ao outro dia uma carta em que a criatura, esposa ou prostituta, me ofertava a sua nudez, o seu amor, e todas as complacências da lascívia.
Os jornalistas esporeavam a imaginação para achar adjetivos dignos da minha grandeza; fui o sublime Sr. Teodoro, cheguei a ser o celeste Sr. Teodoro; então, desvairada, a Gazeta das Locais chamou-me o extraceleste Sr. Teodoro! Diante de mim nenhuma cabeça ficou jamais coberta – ou usasse a coroa ou o coco. Todos os dias me era oferecida uma presidência de Ministério ou uma direção de confraria. Recusei sempre, com nojo.
(Eça de Queirós. O mandarim, s/d.)
Ao descrever a sua vida de milionário, o narrador
- reconhece que as pessoas se aproximam dele com mais respeito e cautela, fato que o deixa desconfortável, por sua natureza humilde.
- sente-se lisonjeado pelo tratamento cerimonioso de que é alvo constante, sobretudo porque as pessoas são honestas em seu proceder.
- ironiza as relações de interesses decorrentes da sua nova condição social, deixando evidente que as pessoas se humilham perante ele.
- ignora a forma como os mais pobres o interpelam, pois não consegue identificar os contatos sem interesses monetários.
- despreza a falta de veneração à sua pessoa, principalmente pelos mais bem nascidos, que não o veem como pertencente à aristocracia.
05. (UNIFESP) Nesta obra, eu quis estudar temperamentos e não caracteres. Escolhi personagens soberanamente dominadas pelos nervos e pelo sangue, desprovidas de livre-arbítrio, arrastadas a cada ato de suas vidas pelas fatalidades da própria carne. Começa-se a compreender que o meu objetivo foi acima de tudo um objetivo científico.
(Émile Zola apud Alfredo Bosi. História concisa da literatura brasileira, 1994. Adaptado.)
Depreendem-se dessas considerações do escritor francês Émile Zola, a respeito de uma de suas obras, preceitos que orientam a corrente literária
- romântica.
- árcade.
- naturalista.
- simbolista.
- barroca.
06. (FUVEST) Nesse livro, ousadamente, varriam-se de um golpe osentimentalismo superficial, a fictícia unidade da pessoa humana, as frases piegas, o receio de chocar preconceitos, a concepção do predomínio do amor sobre todas as outras paixões; afirmava-se a possibilidade de construir um grande livro sem recorrer à natureza, desdenhava-se a cor local; surgiram afinal homens e mulheres, e não brasileiros (no sentido pitoresco) ou gaúchos, ou nortistas, e, finalmente,mas não menos importante, patenteava-se a influência inglesa em lugar da francesa.
Lúcia Miguel-Pereira, História da Literatura Brasileira –Prosa de ficção – de 1870 a 1920. Adaptado.
O livro a que se refere a autora é
- Memórias de um sargento de milícias.
- Til.
- Memórias póstumas de Brás Cubas.
- O cortiço.
- A cidade e as serras.
07. (UNESP) Desde já a ciência entra, portanto, no nosso domínio de romancistas, nós que somos agora analistas do homem, em sua ação individual e social. Continuamos, pelas nossas observações e experiências, o trabalho do fisiólogo que continuou o do físico e o do químico. Praticamos, de certa forma, a Psicologia científica, para completar a Fisiologia científica; e, para acabar a evolução, temos tão somente que trazer para nossos estudos sobre a natureza e o homem o instrumento decisivo do método experimental. Em uma palavra, devemos trabalhar com os caracteres, as paixões, os fatos humanos e sociais, como o químico e o físico trabalham com os corpos brutos, como o fisiólogo trabalha com os corpos vivos. O determinismo domina tudo. É a investigação científica, é o raciocínio experimental que combate, uma por uma, as hipóteses dos idealistas, e substitui os romances de pura imaginação pelos romances de observação e de experimentação.
(Émile Zola. O romance experimental, 1982. Adaptado.)
Depreendem-se do comentário do escritor francês Émile Zola preceitos que orientam a corrente literária
- simbolista.
- árcade.
- naturalista.
- romântica.
- barroca.
08. (FUVEST) — Pois, Grilo, agora realmente bem podemos dizer que o sr. D. Jacinto está firme.
O Grilo arredou os óculos para a testa, e levantando para o ar os cinco dedos em curva como pétalas de uma tulipa:
— Sua Excelência brotou!
Profundo sempre o digno preto! Sim! Aquele ressequido galho da Cidade, plantado na Serra, pegara, chupara o húmus do torrão herdado, criara seiva, afundara raízes, engrossara de tronco, atirara ramos, rebentara em flores, forte, sereno, ditoso, benéfico, nobre, dando frutos, derramando sombra. E abrigados pela grande árvore, e por ela nutridos, cem casais* em redor o bendiziam.
Eça de Queirós, A cidade e as serras.
*casal: pequena propriedade rústica; pequeno povoado.
O teor das imagens empregadas no texto para caracterizar a mudança pela qual passara Jacinto indica que a causa principal dessa transformação foi
- o retorno a sua terra natal.
- a conversão religiosa.
- o trabalho manual na lavoura.
- a mudança da cidade para o campo.
- o banimento das inovações tecnológicas.
09. (Fuvest) TEXTO PARA A QUESTÃO
E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, – coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame, quando
[5] quer amar. Se esta última reflexão é o motivo secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois muito indiscreta, e que eu não me quero senão com dissimulados.
Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim da comissão das Alagoas, com elogios da imprensa; a Atalaia
[10] chamou‐lhe “o anjo da consolação”. E não se pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse; ao contrário, resumindo em Sofia toda a ação da caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer‐lhe perder em um dia o trabalho de longos meses. Assim se explica o artigo que a mesma folha
[15] trouxe no número seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as outras comissárias – “estrelas de primeira grandeza”.
Machado de Assis, Quincas Borba.
No excerto, o autor recorre à intertextualidade, dialogando com a comédia de Molière, Tartufo (1664), cuja personagem central é um impostor da fé. Tal é a fama da peça que o nome próprio se incorporou ao vocabulário, inclusive em português, como substantivo comum, para designar o “indivíduo hipócrita” ou o “falso devoto”.
No contexto maior do romance, sugere‐se que a tartufice
- se cola à imagem da leitora, indiscreta quanto aos amores alheios.
- é ação isolada de Sofia, arrivista social e benemérita fingida.
- diz respeito ao filósofo Quincas Borba, o que explica o título do livro.
- Se produz na imprensa, apesar de esta se esquivar da eloquência vazia.
- se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo dos fortes.
10. (FUVEST) Atente para as seguintes afirmações relativas ao desfecho do romance A Relíquia, de Eça de Queirós:
I. O autor revela, por meio de Teodorico, sua descrença num Jesus divinizado, imagem que é substituída pela ideia de Consciência.
II. Ao ser sincero com Crispim, Teodorico conquista a vida de burguês que sempre almejou.
III. Teodorico dá ouvidos à mensagem de Cristo, arrepende‐se de sua hipocrisia beata e abraça a fé católica.
Está correto o que se afirma apenas em
- I.
- II.
- I e II.
- II e III.
- I e III.
11. (UNICAMP) (...) pediu-me desculpa da alegria, dizendo que era alegria de pobre que não via, desde muitos anos, uma nota de cinco mil réis.
– Pois está em suas mãos ver outras muitas, disse eu.
– Sim? acudiu ele, dando um bote pra mim.
– Trabalhando, concluí eu. Fez um gesto de desdém; calou-se alguns instantes, depois disse-me positivamente que não queria trabalhar.
(Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p.158.)
O trecho citado diz respeito ao encontro entre Brás Cubas e Quincas Borba, no capítulo 49, e, mais precisamente, apanha o momento em que Brás dá uma esmola ao amigo. Considerando o conjunto do romance, é correto afirmar que essa passagem
- explicita a desigualdade das classes sociais na primeira metade do século XIX e propõe a categoria de trabalho como fator fundamental para a emancipação do pobre.
- indica o ponto de vista da personagem Brás Cubas e propõe a meritocracia como dispositivo pedagógico e moral para a promoção do ser humano no século XIX.
- elabora, por meio do narrador, o preconceito da classe social a que pertence Brás Cubas em relação à classe média do século XIX, na qual se insere Quincas Borba.
- sugere as posições de classe social das personagens machadianas, mediante um narrador que valoriza o trabalho, embora ele mesmo, sendo rico, não trabalhe.
12. (FUVEST) CAPÍTULO LIII
. . . . . . .
Virgília é que já se não lembrava da meia dobra; toda ela estava concentrada em mim, nos meus olhos, na minha vida, no meu pensamento; — era o que dizia, e era verdade.
Há umas plantas que nascem e crescem depressa; outras são tardias e pecas. O nosso amor era daquelas; brotou com tal ímpeto e tanta seiva, que, dentro em pouco, era a mais vasta, folhuda e exuberante criatura dos bosques. Não lhes poderei dizer, ao certo, os dias que durou esse crescimento. Lembra-me, sim, que, em certa noite, abotoou-se a flor, ou o beijo, se assim lhe quiserem chamar, um beijo que ela me deu, trêmula, — coitadinha, — trêmula de medo, porque era ao portão da chácara. Uniu-nos esse beijo único, — breve como a ocasião, ardente como o amor, prólogo de uma vida de delícias, de terrores, de remorsos, de prazeres que rematavam em dor, de aflições que desabrochavam em alegria, — uma hipocrisia paciente e sistemática, único freio de uma paixão sem freio, — vida de agitações, de cóleras, de desesperos e de ciúmes, que uma hora pagava à farta e de sobra; mas outra hora vinha e engolia aquela, como tudo mais, para deixar à tona as agitações e o resto, e o resto do resto, que é o fastio e a saciedade: tal foi o livro daquele prólogo.
Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas.
No último período do texto, o ritmo que o narrador imprime ao relato de seus amores corresponde sobretudo ao que se encontra expresso em
- “prólogo de uma vida de delícias” (L. 13-14).
- “prazeres que rematavam em dor” (L. 14-15).
- “hipocrisia paciente e sistemática” (L. 16).
- “paixão sem freio” (L. 17).
- “o livro daquele prólogo” (L. 21-22).
13. (UNIFESP) O que primeiro chama a atenção do crítico na ficção deste escritor é a despreocupação com as modas dominantes e o aparente arcaísmo da técnica. Num momento em que Gustave Flaubert sistematizara a teoria do “romance que narra a si próprio”, apagando o narrador atrás da objetividade da narrativa; num momento em que Émile Zola preconizava o inventário maciço da realidade, observada nos menores detalhes, ele cultivou livremente o elíptico, o incompleto, o fragmentário, intervindo na narrativa com bisbilhotice saborosa.
A sua técnica consiste essencialmente em sugerir as coisas mais tremendas da maneira mais cândida (como os ironistas do século XVIII); ou em estabelecer um contraste entre a normalidade social dos fatos e a sua anormalidade essencial; ou em sugerir, sob aparência do contrário, que o ato excepcional é normal, e anormal seria o ato corriqueiro. Aí está o motivo da sua modernidade, apesar do seu arcaísmo de superfície.
(Antonio Candido. Vários escritos, 2004. Adaptado.)
O comentário do crítico Antonio Candido refere-se ao escritor
- Machado de Assis.
- José de Alencar.
- Manuel Antônio de Almeida.
- Aluísio Azevedo.
- Euclides da Cunha.
14. (UNICAMP) O romance Memórias póstumas de Brás Cubas é considerado um divisor de águas tanto na obra de Machado de Assis quanto na literatura brasileira do século XIX. Indique a alternativa em que todas as características mencionadas podem ser adequadamente atribuídas ao romance em questão.
- Rejeição dos valores românticos, narrativa linear e fluente de um defunto autor, visão pessimista em relação aos problemas sociais.
- Distanciamento do determinismo científico, cultivo do humor e digressões sobre banalidades, visão reformadora das mazelas sociais.
- Abandono das idealizações românticas, uso de técnicas pouco usuais de narrativa, sugestão implícita de contradições sociais.
- Crítica do realismo literário, narração iniciada com a morte do narrador-personagem, tematização de conflitos sociais.
15. (UNICAMP) Leia o seguinte excerto de Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis:
Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes.
(Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p.120.)
Na passagem citada, a substituição da máxima pascalina de que o homem é um caniço pensante pelo enunciado “o homem é uma errata pensante” significa
- a realização da contabilidade dos erros acumulados na vida porque, em última instância, não há “edição definitiva”.
- a tomada de consciência do caráter provisório da existência humana, levando à celebração de cada instante vivido.
- a tomada de consciência do caráter provisório da existência humana e a percepção de que esta é passível de correção.
- a ausência de sentido em “cada estação da vida”, já que a morte espera o homem em sua “edição definitiva”.
16. (FATEC) O homem de espírito é o menos hábil para escrever a uma mulher.
Quando se arrisca a escrever uma carta, sente dificuldades incríveis. Desprezando o vasconço da galanteria, não sabe como se há de fazer entender. Quer ser reservado e parece frio; quer dizer o que espera e indica receio; confessa que nada tem para agradar, e é apanhado pela palavra. Comete o crime de não ser comum ou vulgar. As suas cartas saem do coração e não da cabeça; têm o estilo simples, claro e límpido, contendo apenas alguns detalhes tocantes. Mas é exatamente o que faz com que elas não sejam lidas, nem compreendidas. São cartas decentes, quando as pedem estúpidas.
O tolo é fortíssimo em correspondência amorosa, e tem consciência disso. Longe de recuar diante da remessa de uma carta, é muitas vezes por aí que ele começa. Tem uma coleção de cartas prontas para todos os graus de paixão. Alega nelas em linguagem brusca o ardor de sua chama; a cada palavra repete: meu anjo, eu vos adoro. As suas fórmulas são enfáticas e chatas; nada que indique uma personalidade. Não faz suspeitar excentricidade ou poesia; é quanto basta; é medíocre e ridículo, tanto melhor. Efetivamente o estranho que ler as suas missivas nada tem a dizer; na mocidade o pai da menina escrevia assim; a própria menina não esperava outra coisa. Todos estão satisfeitos, até os amigos. Que querem mais?
http://tinyurl.com/js7dblq Acesso em: 02.02.2016.
O Professor Alfredo Bosi argumenta que “O que se tem até hoje como consenso é a qualificação da perspectiva de Machado de Assis por meio de epítetos negativos: cética, relativista, irônica, sarcástica, pessimista, demoníaca. Os leitores sensíveis compensam a negatividade da impressão geral com atributos de atenuação que, afinal, sempre remetem ao fundo escuro: estilo diplomático, contido, medido, civilizado, mediador. Um olhar que morde e assopra”.
http://tinyurl.com/zvasqko Acesso em: 09.03.2016. Adaptado.
Glossário
epíteto: qualificação
cético: aquele que duvida.
sarcástico: aquele que utiliza ironia cruel.
Assinale a alternativa que relaciona, corretamente, o texto de Machado de Assis e o de Alfredo Bosi.
- O texto de Machado de Assis apresenta uma visão demoníaca, pois descreve a infidelidade do homem de espírito.
- A verve irônica apontada por Bosi não é notada no texto de Machado, que apresenta um tom exclusivamente romântico.
- Bosi é cético em relação a Machado, pois ele duvida da qualidade literária do escritor fluminense.
- O texto de Machado faz uso de sarcasmo e ironia para comparar o homem tolo e o de espírito.
- O estilo de Bosi é mais diplomático que o de Machado, pois o primeiro tem maior repertório linguístico.
17. (UNICAMP) Sobre A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, é correto afirmar:
- A descrição do espaço parisiense no romance retrata exclusivamente o submundo de uma metrópole do final do século XIX e revela as contradições do processo de urbanização.
- O romance, cuja primeira edição é de 1901, faz uma apologia da vida urbana e do desenvolvimento técnico que marcaram o final do século XIX nas grandes cidades europeias.
- No romance, Zé Fernandes é uma personagem secundária que ganha importância no desenvolvimento da narrativa, ao apresentar a “seu Príncipe”, Jacinto, a luxuosa Paris.
- No romance, é das rendas provenientes de propriedades agrícolas em Portugal que provém o sustento da cara e refinada vida de Jacinto em Paris.
18. (Fuvest) Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de dona Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e, conseguintemente, que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas.
Não sei por que até hoje todo o mundo diz que tinha pena dos escravos. Eu não penso assim. Acho que se fosse obrigada a trabalhar o dia inteiro não seria infeliz. Ser obrigada a ficar à toa é que seria castigo para mim. Mamãe às vezes diz que ela até deseja que eu fique preguiçosa; a minha esperteza é que a amofina. Eu então respondo: “Se eu fosse preguiçosa não sei o que seria da senhora, meu pai e meus irmãos, sem uma empregada em casa”
Helena Morley, Minha vida de menina.
São características dos narradores Brás Cubas e Helena, respectivamente,
- malícia e ingenuidade.
- solidariedade e egoísmo.
- apatia e determinação
- rebeldia e conformismo.
- otimismo e pessimismo.
19. (UNESP) Leia o trecho do conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis (1839-1908),
A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha de flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para respirar, e era fechada atrás da cabeça por um cadeado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras.
O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado.
Há meio século, os escravos fugiam com frequência.
Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão. Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia alguém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando.
Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar-se-á generosamente” – ou “receberá uma a gratificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse.
Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem.
(Contos: uma antologia, 1998.)
A perspectiva do narrador diante das situações e dos fatos relacionados à escravidão é marcada, sobretudo,
- pelo saudosismo.
- pela indiferença
- pela indignação.
- pelo entusiasmo
- pela ironia.
20. (FATEC) Memorial de Aires é o último romance escrito por Machado de Assis, tendo sido publicado em 1908, ano da morte do autor. Obra de caráter autobiográfico, apresenta-se como diversas entradas em uma espécie de diário, em que a relação com a velhice, as dificuldades dos relacionamentos amorosos e a futilidade da elite brasileira no final do século XIX são retratadas por meio de um série de episódios que se intercalam.
O trecho a seguir foi retirado do prefácio Advertência, que introduz a obra.
Quem me leu Esaú e Jacó talvez reconheça estas palavras do prefácio: “Nos lazeres do ofício escrevia o Memorial, que, apesar das páginas mortas ou escuras, apenas daria (e talvez dê) para matar o tempo da barca de Petrópolis”. Referia-me ao Conselheiro Aires. Tratando-se agora de imprimir o Memorial, achou-se que a parte relativa a uns dois anos (1888-1889), se for decotada de algumas circunstâncias, anedotas, descrições e reflexões, — pode dar uma narração seguida, que talvez interesse, apesar da forma de diário que tem. Não houve pachorra de a redigir à maneira daquela outra, — nem pachorra, nem habilidade. Vai como estava, mas desbastada e estreita, conservando só o que liga o mesmo assunto. O resto aparecerá um dia, se aparecer algum dia
ASSIS, Machado de. Memorial de Aires. In:______. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986. p. 1096.
Com base na leitura dos textos e nas obras de Machado de Assis, é correto afirmar que
- Memorial de Aires e O Alienista são obras de crítica social, mas não trazem a visão irônica da sociedade que é comum à produção machadiana.
- Quincas Borba e Memorial de Aires narram a trajetória de protagonistas que, apesar das imposições sociais, conseguem atingir seus objetivos.
- Memórias Póstumas de Brás Cubas e Memorial de Aires apresentam um narrador em terceira pessoa que relata os fatos tendo limitado conhecimento da história e dos detalhes da trama.
- Iaiá Garcia e Memorial de Aires apresentam características claramente identificadas com o movimento Realista, compondo, com Memórias Póstumas de Brás Cubas, a chamada Trilogia Realista.
- Dom Casmurro e Memorial de Aires seguem a tradição do romance psicológico, debruçando-se nos motivos íntimos por trás das escolhas e das ações e reações das personagens.